sexta-feira, 28 de novembro de 2014

#10 - O MENINO DE SUA MÃE, Fernando Pessoa

No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas trespassado
-- Duas, de lado a lado --,
Jaz morto, e arrefece.

Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.

Tão jovem! que jovem era!
(Agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
"O menino da sua mãe".

Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lhe a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.

De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço... Deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.

Lá longe, em casa, há a prece:
"Que volte cedo, e bem!"
(Malhas que o Império tece!)
Jaz morto, e apodrece,
O menino da sua mãe.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

#9 - THE BOMBS, Harold Pinter

There are no more words to be said
All we have left are the bombs
Which burst out of our head
All that is left are the bombs
Which suck out the last of our blood
All we have left are the bombs
Which polish the skulls of the dead

February 2003

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

#8 - O ÚLTIMO ADEUS DUM COMBATENTE, Vasco Cabral

Naquela tarde em que eu parti e tu ficaste
sentimos, fundo, os dois a mágoa da saudade.
Por ver-te as lágrimas sangrarem de verdade
sofri na alma um amargor quando choraste.

Ao despedir-me eu trouxe a dor que tu levaste!
Nem só o teu amor me traz a felicidade.
Quando parti foi por amar a Humanidade
Sim! foi por isso que parti e tu ficaste!

Mas se pensares que eu não parti e a mim te deste
será a dor e a tristeza de perder-me
unicamente um pesadelo que tiveste.

Mas se jamais do teu amor posso esquecer-me
e se fui eu aquele a quem tu mais quiseste
que eu conserve em ti a esperança de rever-me!